Há 48 anos, a imagem de um rapaz negro segurando nos braços o corpo do jovem Hector Pieterson, de apenas 13 anos, chocou o público e chamou atenção para o que acontecia na África do Sul.
No dia 16 de junho de 1976, cerca de 20 mil estudantes de escolas secundárias de Soweto, na África do Sul, realizaram um protesto contra a decisão do governo de que eles deveriam ser ensinados na língua africâner, a língua de seus opressores coloniais.
Sam Nzima, um fotojornalista de 42 anos de idade, foi enviado para o local. Ele trabalhava para o The World, um jornal escrito por negros para os negros. Sua publicação irmã, The Star era para os brancos. Ele chegou a escola Naledi por volta das seis da manhã. Os alunos já estavam preparando seus cartazes. “Eu sabia que seria preso ou morto. Não havia balas de borracha na época. Era munição real. Quando eles sacam a arma, você deve saber que você está morto”.
Algumas horas mais tarde, os alunos atravessavam Soweto, agitando os cartazes e cantando. De repente um estrondo e espessas nuvens de gás lacrimogêneo encheram as ruas. A polícia marchava pelas ruas, gritando com os alunos para se dispersarem. Em um determinado momento, Nzima ficou entre os estudantes e a polícia, e viu quando um comandante branco enfurecido disparou sua arma contra a multidão. Os alunos se dispersaram. “Todo mundo estava atirando a esmo”, diz Nzima. “Eu vi um menino cair.” Mbuyisa Makhubo, com 18 anos, já tinha terminado a escola e não fazia parte do protesto. Ele estava em casa quando ouviu os tiros e correu para tentar salvar o menino baleado. Makhubo colocou o jovem Hector Pieterson, de apenas 13 anos, nos braços e correu para levá-lo a uma clínica médica. Um carro parou em frente a eles para transportar o menino, mas já era tarde demais, ele estava morto.
Desde o momento em que o policial branco disparou o primeiro tiro, até o ponto onde o corpo do menino foi carregado para dentro do carro, Nzima tirou seis fotos. “Eu não esperava ver um menino de 13 anos de idade, sendo baleado pela polícia”, diz ele. Muitos ficaram feridos ou mortos e Hector Pieterson foi o primeiro. Nzima sabia que as fotos eram boas, mas também sabia que ele iria ser apontado pela polícia por fotografar a violência. Ele então rebobinou o filme e colocou-o em sua meia, então começou a fotografar com um rolo novo quando os estudantes enfurecidos se voltaram contra a polícia. Os alunos pegaram um policial, o jogaram no chão e atearam fogo. Quando outros policiais viram que Nzima estava tirando fotos, eles o forçaram a abrir todas as suas câmeras. “Todos os filmes foram expostos”, diz Nzima. “E aquele do policial que foi morto pelos alunos foi destruído.”
Edição extra do jornal The World
Quando as fotos foram reveladas, algumas horas mais tarde, os editores começaram a questionar sobre publicar ou não a imagem de um Makhubo claramente traumatizada carregando um menino morto em seus braços, com sua irmã correndo ao lado em angústia. “Este filme vai horrorizar as pessoas”, disse um editor. “Se usarmos esta imagem, ela vai desencadear uma guerra civil na África do Sul.” Outro respondeu que não havia melhor ilustração do que estava acontecendo em Soweto. As crianças tinham sido mortas pela polícia do Apartheid. Este último argumento ganhou, e o The World publicou uma edição extra à noite.
Ninguém estava preparado para o impacto. The World tinha relacionamento com agências internacionais e, no dia seguinte, a foto de Nzima estampava as páginas dos jornais de Nova York a Moscou. De repente, o mundo não podia mais ignorar o horror do Apartheid. Quase de um dia para o outro a opinião internacional endureceu contra o regime do Apartheid na África do Sul. O governo dos EUA condenou o tiroteio e ativistas em todo o mundo começaram a fazer lobby por sanções econômicas, que eventualmente colocaram o governo do Apartheid de joelhos. Na África do Sul a imagem ajudou a lançar um levante civil e encorajou o movimento de libertação negra.
Para Nzima no entanto, a repercussão da foto foi terrível. Poucos dias após a publicação da foto, ele recebeu um telefonema de um amigo na força avisando que a polícia tinha sido dado novas ordens: Se ele fosse encontgrado fotografando, eles deveriam atirar para matar e então preencher os formulários dizendo que foi uma bala perdida. Nzima imediatamente demitiu-se do The World e fugiu para sua cidade natal de Lillydale. Três meses depois, a polícia o alcançou e colocou-o sob prisão domiciliar. Ele nunca mais tirou uma foto novamente. O governo fechou o The World dois anos depois, e invadiu o escritório. Acredita-se que os negativos do Nzima tenham sido destruídos.
Masana Sam Nzima nasceu no dia 8 de agosto de 1934, em Bushbuckridge, África do Sul e morreu no dia dia 12 de maio de 2018, em Nelspruit, África do Sul.