Os Castrati foram protagonistas de um dos capítulos mais cruéis da história da música ocidental. Eles eram cantores masculinos submetidos a castrações antes da puberdade, a fim de preservar suas vozes agudas e desenvolver um alcance vocal extraordinário. Essa prática começou no século XVI na Itália e atingiu seu auge nos séculos XVII e XVIII.
Astros das óperas
O costume se popularizou quando o Vaticano baniu as mulheres dos coros da igreja, criando uma necessidade de cantores com vozes agudas. Os meninos que se tornavam castrati eram geralmente recrutados de famílias pobres, com a promessa de terem uma vida melhor por meio da música. A prática da castração era restrita à Itália, mas os castrati se apresentavam por toda a Europa.
As crianças selecionadas eram submetidas a uma cirurgia delicada, na qual os testículos eram removidos (a operação era ilegal e geralmente executada por dentistas ou cirurgiões amadores). Essa intervenção impedia a produção de testosterona e resultava em alterações físicas, como a ausência do crescimento da laringe, permitindo que suas vozes se mantivessem nos tons agudos típicos das vozes femininas.
O treinamento dos castrati era rigoroso e exigia grande disciplina. Eles estudavam canto, técnica vocal e interpretação musical, tornando-se cantores extremamente virtuosos. Sua fama se espalhou por toda a Europa e eram procurados por nobres, papas e compositores renomados, se tornando astros das óperas da época. Isso porque alcançavam uma extensão vocal impressionante, com uma amplitude que combinava a potência e o alcance dos tenores e contraltos atuais.
Dois dos castrati mais famosos foram Francesco Bernardi Senesino e Farinelli (cujo nome de batismo era Carlo Maria Michelangelo Nicola Broschi). Senesino, famoso por sua colaboração com o compositor Georg Frederick Handel, recebia uma fortuna em dinheiro por ano. Mas Farinelli superou a popularidade de Senesino. Ele ganhava ainda mais dinheiro, atuando em toda a Europa. O cantor chegou a ser contratado pela rainha Isabel Farnésio da Espanha na esperança de curar a depressão de seu marido, o rei Filipe V.
Os castrati eram capazes de atingir notas altíssimas e sustentá-las por longos períodos de tempo, encantando o público com sua habilidade técnica e performances emotivas. Sua presença no palco também era marcante. Apesar de terem corpos adultos, eles mantinham características físicas juvenis, como a falta de barba e um corpo esbelto. Sua aparência andrógina e vozes angelicais despertavam fascínio e adoração entre o público. No entanto, a prática da castração levantava questões éticas e morais. A mutilação dos corpos desses jovens em nome da música era um sacrifício imenso. Apesar de muitos castrati alcançarem sucesso e fama, outros enfrentavam dificuldades e vidas solitárias, sendo excluídos da sociedade devido à sua condição.
No final do século XVIII, a prática começou a perder a popularidade, embora tenha continuado no século XIX. O último castrato conhecido foi Alessandro Moreschi. Nascido em 1858, ele foi nomeado Primeiro Soprano do coro da Capela Sistina em 1883. O fim oficial da era dos castrati veio em 1903, quando o papa Pio X decretou que os meninos deveriam assumir os papéis de contraltos e sopranos nos corais.